segunda-feira, março 21, 2011

Segundo andar

Segundo andar, frente. Morar num apartamento tão perto do chão tem lá suas particularidades, e não estou falando da alegria de ouvir o barulho da chuva batendo no chão, coisa impossível para quem mora no décimo andar, por exemplo. A proximidade com a rua me fez ver a quantidade de gente maluca que circula pelo mundo, ou mais especificamente, pela minha rua.

1) O cara do gás. O palco é seu sonho maior, e o ensaio pode ser enquanto dá gritinhos ensaiados para anunciar a chegada do seu produto. "Olha oooooooooooo gaaaaaaaaaaaaaix! Au!". Em tom crescente. Juro.

2) A doida do radinho. Ela é limpinha, não é mendiga, anda com um radinho de pilha colado na orelha e narra tudo o que ouve. É doida, doida, doida. Mansinha de tudo, mas ainda assim, doida. O rádio é sempre novinho, sinal de que alguém cuida dela com algum desvelo. Bacana é ser atualizada no noticiário pela maluquete da rua.

3) A mendiga que tem medo de escuro. Mendiga mesmo, doidinha, vive falando sozinha, e eu vivo apurando as orelhas para saber o que há de novo, Scooby. Numa dessas vezes em que puxei papo é que ela disse que não ia "lá em cima" (parte mais alta da ladeira), porque tinha medo de escuro. Meu coração apertou. De que trevas essa criatura foge, na verdade? Morro de pena.

4) O brother do Chow Chow. Que eu saiba, ele não tem camisa. Carequíssimo, mal encarado, anda muitas vezes por dia com um Chow Chow e um outro cachorro que, cofesso, foi obliterado pela fofurice do cão da língua roxa. Ardo de vontade de fazer amizade com os caninos, mas acho que o dono morde.

5) Nelson. Last but not least. Nelson é o porteiro-show da manhã do meu prédio. Não passa uma alma pela rua que não grite para ele uma saudação, que não dê um bom dia entusiasmado, que não sacuda as cuecas de alegria por ver o Nelson na guarita. Não, ele não está nem perto de ser simpático, pelo menos não comigo. Por outro lado, tem velhinha que traz biscoitos para ele, que manda sopa (DE MANHÃ), que dá presentinhos. Não, Nelson não é o porteiro "Colírio do Mês". Nelson é um mito. Nelson é pop, um ídolo. Um ícone.

E tirando as pessoas, ainda tenho uma coleção de baratas que escalam a parede para a minha casa, baratas de todas as espécies, grandes, pequenas, cascudas, francesas. Todas nojentas, fadadas a morrer com jatos de... perfume!

É. Minha lata de veneno acabou.

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Tentando voltar, mon ami, tentando voltar. Valeu o puxão de orelhas, vamos ver se engrena.