sexta-feira, fevereiro 14, 2003

Ouço Closing Time, do Semisonic, e desde 17 de abril de 2000 eu não a ouvia. Desde que parti da belíssima cidade sul-baiana, quando o Junior gravou pra mim essa música. Repassamos a fita cassete duas horas antes do meu embarque. Nunca mais tive coragem de ouvir o material gravado naqueles dois dias em que estive acampada na base, esperando ordens para me desligar.

Saudade boa que deu. Equipe boa, amigos não de toda a vida, mas tão intensos naquele período curto de vida que fez valer. Poucos ficaram, estranhamente. Um foi pra onde eu tinha que ter ido há dois anos (mas não Miami, por Deus! Maine, e "eu não desisto assim tão fácil, meu amor, das coisas que eu quero fazer e ainda não fiz. Na vida tudo tem seu preço, seu valor, e o que eu mais quero nessa vida é ser feliz!"), três voltaram pra terra do "Mar de Montanhas", a maioria ficou.

E eu toquei meu dragão adiante, vamos continuar a voar, meu bichinho nada doce, alter ego escamado. Segundo Caio Fernando Abreu, "Os dragões não conhecem o paraíso".

Errado, apesar do texto lindo. Eu, dragão que sou, tão bem caracterizada, conheci o inferno. Ora, se fui a um extremo, inevitavelmente conheci o outro. Isso é fato! Não sombra se não houver luz. A parte boa de ser tão intensa é essa: deixo vir a dor inteira, deixo que ela se vá na íntegra, me deixo ser feliz por completo, absorvo cada gota de felicidade que me é permitida pelo caminho. E logo adiante estou pronta de novo para uma chacoalhada, um tranco, um freio de arrumação. E pra ser feliz de novo.

"Tenho por princípios nunca bater portas, mas como mante-las abertas o tempo todo, se em certos dias o vento quer derrubar tudo?"

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E deixei o meu dragão esticar as asas sob o sol. Voamos, eu agarrada em seu pescoço numa confiança cega, num amor incondicional. Olhos fechados, deixei que ele me conduzisse para onde éramos necessários. Alguns dois, três anos parados na mesma cidade, e partimos de novo. A quest. A big quest. We won!

Indiana Jones e seu chapéu, inseparáveis, o dragão e eu cruzamos os ares em busca de respostas. Vôo turbulento, mas eu estava abraçada ao seu pescoço, e com o meu dragão por perto, nada pode me ferir. "Eu estou vestida com as roupas e as armas de Jorge", mas desta vez o dragão era parte do arsenal de proteção.

Pairamos, pousamos, pairamos de novo, nos perdemos, nos achamos. Nos achamos e achamos a nós mesmos. Achamos também muitas das respostas que precisávamos. Vôo de reconhecimento; não do terreno, mas de autoconhecimento. Todos as nossas verdades mudaram. Família, amor, carinho, anjos, companheiros, tudo isso foi revisto e posto sob nova direção. Uma boa direção.

Nós, o dragão e eu, e os bons companheiros. Muitos, todos, todos os que cruzaram o nosso caminho nesses últimos quinze dias. Excelentes peregrinos como nós, cujos caminhos se tocaram por alguns instantes de luz.

A volta foi mais suave. Eu, mais leve, corpo e mente. Ele, mais maduro, asas maiores, com uma impressionante autonomia de vôo. E na bagagem — e no coração — mais um membro para essa troupe saltimbanca: a águia, que ainda não sabe voar com as próprias asas, mas que afivela o cinto e plana sem medo algum. Mais um membro para o clã das Almas sem Âncora, mais um pra ensinar e aprender.

Somos três agora.

"Junte um bico com dez unhas, quatro patas, 32 dentes e o valente dos valentes ainda vai nos respeitar. Todos juntos somos forte, não há nada pra temer. "

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