A coisa que mais sinto falta não é o cheiro de sabonete com maresia que só os ombros dele tinham, nem o gosto das sardas germânicas, nem seus olhos amorosos me acompanhando o caminhar. A coisa que sinto mais falta é da maneira que eu me via espelhada nos olhos dele. Sinto falta do meu reflexo nele, da mulher bonita em que ele me transformou.
Peguei uma fotografia minha, feita por ele. Os olhos que não encaram a câmera são meus, mas a mulher bonita, segura e um tanto matreira não sou eu. Aquela é a mulher que ele via, a mulher por quem ele se apaixonou entre uma garfada da salada e uma colherada do meu coração.
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Com um, a música era "Come Together", embora "Penny Lane" me leve de volta para aqueles olhos. "Only You" é a música com o fã do Portishead. E ainda tem "Kiss the rain" com um certo menino lourinho, "Enredo do meu samba" com aquele descendente direto dos mouros. "Adagio for strings", uma peça lamentosa para violinos, me catapultava direto para os braços daquele de olhos verdes. E em falando em olhos verdes — e por que não? sinalzinho no canto da boca —, que tal "Cry for help" e "By my side", que faziam o milagre de Lázaro com um certo rapazinho?
"Claire de Lune" era a trilha sonora ideal para dores de cotovelos, e na segunda posição dos cataclismas emocionais vinha "Estudo em Ré Maior", uma depressão em piano. Mas tinham as músicas de levantar o ânimo: "Go West" era a senha para que o papai ignorasse a lei (promulgada por ele em acordo com a mamãe) de não ouvir música alta para não incomodar os vizinhos: ele mesmo ia lá e colocava a música nas alturas. "Bigmouth Strikes Again" me fazia saltitar pela casa, e se virasse "Man! I feel like a woman" e "Dancing Queen", era um dia a menos de Prozac.
Na trilha de agora, "Boss of me" tem o efeito regenerativo no meu (mau) humor. Efeito curto, mas efeito. Se aliado à deliciosa "I'm afraid of Britney Spears", ganhei meu dia! "Ne me quitte pas" com a Maysa ainda é campeã do mundo, mas está quase empatada com Jacques Brel cantando a mesma coisa. "Spooky Madness" lembra aquele amigo-palhaço, "When I come around" é a música que o meu amor-pra-toda-a-vida cantava, apesar de que a síndrome de Rogério Flausino dele me faz achar que "a obrigação da sua voz é estar aqui". E ponto.
Por que toda essa digressão musical? Porque pela primeira vez na minha vida uma pessoa não veio acompanhada de um BG! Não há uma única música neste mundo que me faça lembrar daqueles malares nórdicos! Como, deuses piedosos, como atribuir um valor a um homem que não veio musicado?
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Se eu estivesse apaixonada por ele, tenha certeza de que o meu lado advogada diria: "A música dele é cantada pelo silêncio".
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