É engraçado o mecanismo de fuga do cérebro.
A cada vez que preciso me provar que sou uma pessoa legal, que eu quebrei as expectativas, que eu fiz outra pessoa — que não esperava — feliz, eu me escondo atrás das saias de uma das "sogras" mais lindas que eu já tive.
Sou capaz de sentir sob o braço a textura do balcão do orelhão do aeroporto de Guarulhos, sou capaz de lembrar com a pele qual a temperatura do dia. Me lembro de cada linha do diálogo com aquela mulher fantástica, que abriu sua casa pra mim, que me tratou como a filha que não fui, como a rainha que não sou. Ela e o sogro mais agradável da minha história.
Eu me lembro da hora exata do telefonema, da luz que vinha da pista, do meu coração batendo alto, com medo de que ela não me deixasse terminar de dizer tudo o que eu precisava dizer. Ela, que tem o nome que eu sempre quis para uma filha, que fez pudim pra mim, que me achava "a cara" da Betty Lago (quanta honra!).
Para fazer efeito, eu tenho que lembrar do telefonema desde o início, quando o outro filho atendeu e ela relutou em vir falar comigo. Eu também relutaria, dadas as circunstâncias. Mas tudo o que eu queria dizer era: muito obrigada por tudo.
E disse. E o medo que ela tinha de ser destratada sumiu por encanto. A partir daí, pouca coisa anda nos trilhos da lembrança. É uma mistura de promessas de que vou voltar, com garantias de que ia me mandar as receitas com as quais fui mimada, declarações de gostar, de querer bem. Tanto minhas quanto dela.
Eu tenho muita vontade de reve-la. Se eu pudesse escolher uma lição boa das milhares que tive nessa viagem, é a de que amar tão desavergonhadamente não precisa de tempo cronológico. E nunca me arrependi dos meus amores instantâneos: foram os mais honestos, tanto da minha parte quanto de outrém. Foi o conjunto todo que me fez hastear uma bandeira com o nome dela e fundar seu fã-clube. Sou louca por ela.
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Minhas sogras e sogros sempre, sempre me adoram. Por que seus filhos não seguem os exemplos?
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