sábado, março 29, 2003



Swimming in a fishbowl

Adeus. Pra sempre.

Como um dia quis que o nosso "pra sempre" fosse pra sempre, quero que esse adeus também dure. Pra sempre. Não precisa me levar até a porta. Já me expulsou tantas vezes da sua vida que conheço bem o caminho de saída da sua alma. Estou levando as malas. As minhas. Só.

Não quero nada que tenha (des)construído ao seu lado. Os "nossos" planos já não me servem mais. Ser feliz com você nunca foi viável. Será que fomos? Será que não tomamos a pílula azul, e temporariamente nos deixamos voltar para a Matrix?

Vou derrubar as paredes que erguemos juntos para guardar nossos sonhos surrados, já meio gastos, malas rodadas. Vou arrancar o piso aveludado que escondia a podridão do assoalho velho, de madeira enegrecida pelo tempo e pelos pés que nos pisaram o coração. Vou arrancar os papéis de parede e deixar ver as ranhuras de vasos atirados contra nossas cabeças, furos de pregos que sustentaram quadros de outrora. Vou exibir as chagas que as unhas de outra deixaram no concreto da sua alma, vou deixar que o mundo veja as marcas das minhas mãos na tinta descascada, mãos que tentavam se agarrar a qualquer fragmento, para que eu não me afogasse nas águas do meu próprio desespero.

Todos vão ver a marca da bala que me trespassou a alma, vinda de trás, e os fragmentos de memória olfativa, táctil e auditiva que saíram pelo buraco feito pelo tiro. Os novos habitantes das nossas almas vão encontrar o sulco do meu corpo encolhido de dor no chão duro. Dos seus pés ruminantes, cavando um pequeno buraco para jogar o que restasse de mim. Os nossos novos hóspedes verão pequenos furos no colchão, no parapeito da janela, na mesa da cozinha, nas suas mãos, nas minhas.

Lágrimas. Todas elas que derramei quando ainda acreditava. Vou regar todos os nossos vasos de planta com as minhas lágrimas ácidas, e ver morrendo uma por uma. Flor por flor, que tanto trabalho tivemos para convencer que o mundo aqui fora não é cruel. Uma gargalhada amarga. Mentimos, florezinhas! O mundo pode não ser cruel, mas as pessoas são. Ele é. Eu sou.

Vou derrubar a lápide de um amor natimorto, que embalamos nos braços, criança no sono, na esperança de que aquele arremedo de cuidado o ressucitasse. Vou arrancar as cortinas primaveris e deixar bem à mostra as marcas que fiz com a minha testa no vidro da janela, esperando que o inverno se fosse, que você viesse, que parasse de doer. Esperando que tudo fosse de verdade. E pra sempre. Como foi o amor. Como será esse adeus.

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Escrever é a maneira que tenho de vomitar minha dor, ao invés de só assimilar, calada. Alguns gritam, outros esperneiam. Eu não. A minha válvula de escape é escrever.

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Kanjicho, Ensemble Nipponia
What´s my age again, Blink 182
Wicked Games, Chris Isaaks

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